Quem sabe a gente se encontre na fila do mercado ou da padaria, em um ponto de ônibus ou em qualquer encontro da vida. Quem sabe em um desses encontros você esteja de mãos dadas com outra mulher, pode ser que eu esteja já casada, com filhos na escola e uma vida movimentada.

Talvez até lá você já tenha ido conhecer todas aquelas cidades que um dia disse pra mim que conheceríamos juntos. Talvez até lá eu tenha terminado de ler meus livros e comprado outros, conhecido muitas pessoas e tentado descrevê-las nos textos que escrevo. Talvez tenhamos realizado nossos sonhos, criado alguns e guardado aqueles em uma gaveta qualquer. Talvez tenhamos mudado a nossa vida e a transformado em algo que nunca nem se quer nos permitimos imaginar.

Quem sabe nessas filas da vida possamos conversar um pouco e dizer que realizamos nossos maiores desejos, depois pagar a conta e ir embora procurando outras filas e outras vidas que deixamos escapar.



Ta tudo tão passageiro hoje em dia que quando alguém morre tudo parece ficar cinza, sem vida. Mas daqui a pouco volta tudo ao normal. Não nos importamos mais com as pessoas a nossa volta. Aquele cara não tem onde morar, mas não podemos ajudar porque ele deveria arrumar um emprego e parar de moleza. Mas se ele morre a gente com toda a certeza vai ouvir alguém dizer: “Coitado, era um cara bom, porém não teve sucesso na vida. Uma pessoa tão honesta merecia mais do que teve. Ele podia ter pedido ajuda, eu ajudaria sem problemas.” Mas as pessoas só sabem criticar, falar mal umas das outras e serem individualistas. A vida não ta fácil nem pra mim que tenho tudo de mão beijada, imagina pra alguém que passa fome e perdeu o emprego, mas a única coisa que a maioria das pessoas vai fazer é olhar a situação do próximo e criticar. 

Enquanto a pessoa ta viva ela não presta, faz tudo errado e é odiada por um monte de gente. Só que se acontece uma desgraça na vida dessa pessoa aí as redes sociais vão à loucura, é foto junto, é mensagem, é post falando de como a pessoa era boa e vai fazer falta, é falsidade e mais falsidade. Não estou dizendo que todo mundo é assim, existem pessoas que ainda tem amor no coração, mas não são todas, na verdade são pouquíssimos seres humanos que ainda conseguem repassar um pouco de amor e não ódio.

A gente corre pra cá e corre pra lá, aí quando a gente se toca de que se esqueceu da pessoa a fixa caí, a fixa não só cai como quebra também. É nessa parte que entra o desespero, começamos a ver que estamos rápidos demais e que deixamos todas as memórias daquela pessoa para trás, percebemos que mesmo com tudo o que aconteceu e mesmo tendo sido tão importante a presença dela na nossa vida a gente simplesmente se deixou levar pela agitação do momento e esqueceu. A gente chorou, disse que nada seria como antes, reclamou, perdeu as esperanças, se desencantou pela vida, mas no fim acabamos achando uma escapatória para todos esses problemas, o esquecimento. Paramos de pensar tanto, nos ocupamos com coisas fúteis, fizemos qualquer coisa para manter a mente ocupada de lembranças que são pura saudade, uma saudade ruim que não pode e nunca poderá ser quebrada, ela é forte, às vezes mais forte que nós, e acaba nos machucando quando tentamos arrumar um jeito de destruí-la, mas como não conseguimos acabamos por optar pelo caminho mais fácil, e quando menos percebemos a gente esqueceu até porque ela partiu.

A gente se deixou levar por tanta coisa que quando a gente olhou pra frente não conseguiu ver mais aquelas memórias e lembranças que sempre recordava. Agora ta tudo mais embaçado, tudo menos colorido e muito mais triste. Quando foi que o tempo passou tão rápido assim?



A gente anda em uma estrada durante toda a nossa vida, às vezes encontramos a chuva, outras vezes encontramos as pessoas. Mas podemos dar a sorte de encontrá-las ao mesmo tempo.

Mais uma vez a chuva nos pegou desprevenidos, saímos correndo pra não nos molhar, mas acabamos escorregando e saindo da pista. Caímos, levantamos e fomos à procura da estrada novamente, mas com isso acabamos chegando muito perto do precipício, essa já é a terceira vez que isso me acontece. Não estava lá sozinha, você estava comigo, me encorajando para pular. Dizia "vamos, vai dar tudo certo", mas como tenho esse pessimismo idiota dentro de mim acabei por dizer que preferia ficar ali, onde tudo era mais calmo, queria encontrar novamente o caminho porque, afinal, se não estamos na estrada como é que vamos ser alguém na vida, não é mesmo?

Nós podemos fazer muitas escolhas durante a nossa existência, cada uma delas vai trazer consequências diferentes. Se a gente escolhe nunca correr durante a chuva, nunca sair da estrada por vontade própria, e escolhe caminhar em direção a um emprego cansativo e a um futuro monótono, aí sim, isso é o que eles dizem ser alguém na vida, isso é ter uma vida boa, uma vida de adultos chatos que não conseguem entender o porquê de alguém gostar de outra pessoa. Uma vida de poucos amigos é o que eles têm, só conseguem ver o futuro salário grandioso que vão receber e com o que irão gastar, muito legal né? 

Podemos lutar contra isso, é apenas questão de querer, de se importar, porque querem nos transformar como eles, acham que fazemos tudo errado sempre, mas temos um motivo para cada pequena ação, só que nunca nos escutam e nem ao menos tentam entender os nossos motivos. 


Mas a gente não liga, consigo ouvi-los gritando e nos chamando lá da estrada, só que pela primeira vez eu não quero escutar. Não quero saber o que eles têm para me dizer, nem quero discutir de novo que tudo o que eles fazem não vale e nunca valerá à pena, pois mais uma vez encontrei a chuva e alguns motivos a mais para ser feliz.